"O futebol precisa de condições"
O 31 do Sporting não é apenas Liedson. É
também, em milhões de euros, aquilo que o clube gasta por
ano, entre futebol e modalidades amadoras. Neste momento, o
equilíbrio entre as duas áreas leva a que seis desses
milhões sigam para as modalidades e a que os 25 que restam
deixem o futebol num limbo. "É pouco para sermos
campeões, porque fica muito longe dos 40 que gastam os outros
candidatos, mas muito para ficarmos em terceiro lugar, porque quem vem
abaixo de nós gasta apenas seis ou sete", diz José
Eduardo Bettencourt, na véspera da Assembleia Geral destinada a
aprovar o plano de restruturação financeira que pode
deixar a SAD um pouco mais desafogada. "A partição do que
podemos gastar é a opção de gestão que se
nos coloca", reforça.
Desenganem-se os que pensam que, uma vez aprovada a
restruturação, reduzido o passivo (e os encargos com a
banca) em 55 milhões de euros, o futebol do Sporting
passará a viver confortavelmente e se aproximará dos 40
milhões gastos anualmente pelos rivais. "Uma coisa é
aumentarmos um cheirinho, tornarmo-nos um pouco mais competitivos,
outra é passar para os 40 milhões. Talvez possamos gastar
mais, mas não podemos afectar ao futebol meios que fazem falta
à nossa sobrevivência", diz o líder leonino,
esperançado em que sejam "os outros a gastar menos", porque "no
futebol, nestes últimos anos, todos têm perdido".
Certo é que, se o plano não passar, em algum lado o
Sporting terá de apertar o cinto. "Temos de viver com aquilo que
podemos, mas é utópico pensar gastar menos com o futebol.
Porque mesmo aqueles que, como eu, se fizeram do Sporting também
pelo sucesso das modalidades estão hoje dependentes de
vitórias no futebol. O futebol tem de ter
condições para viver", esclarece o presidente leonino,
sem querer "fazer demagogia". Por isso, não embarca em promessas
de reforços. Pelo contrário, admite que será
sempre preciso vender. "Um clube como o Sporting precisará
sempre de vender. Até em Inglaterra já há quem
venda e não compre, porque isto não pode viver só
dos 'sheiks'. O negócio do futebol começa a cheirar a
barril de pólvora e estamos a queimar os últimos
cartuxos", adverte.
"Paulo Bento não sai pela porta pequena"
José Bettencourt garante que não se sente refém
da frase que está a marcar-lhe o mandato, o "Paulo Bento
forever" que está "cansado" de ouvir de volta sob a forma de
pergunta. "Os interesses do Sporting têm de estar acima do que eu
diga", afirma, mas apenas para assegurar que a mudança de
treinador não os defenderia. A confiança no treinador vai
ao ponto de o levar a afirmar que "Bento não sairá do
Sporting pela porta pequena".
"Mudar de treinador seria uma solução
demagógica, populista e ineficaz. Era um paliativo, quando
há questões estruturais na origem desta tensão",
considera o presidente leonino, para em seguida elencar os
méritos do já longo consulado de Bento. "É o
segundo treinador com mais longevidade no Sporting, só
suplantado por Szabo. Já atingiu várias metas e recordes.
E tem uma participação directa no facto de o Sporting ter
a cabeça fora de água. São três Ligas dos
Campeões seguidas, com a primeira participação nos
oitavos-de-final. É a venda do Nani. Não ganhando um
campeonato, teve prestações honrosas, fez melhor que
muitos, com muito menos gastos".
Tudo no passado? Não. Bettencourt serve-se também do
presente para suportar o seu treinador. Fala no que os sportinguistas,
que encontra pelo país, lhe dizem do técnico e ainda do
trabalho que vê. "Há bom ambiente no grupo, boa
relação entre jogadores e treinador".
Reunião de crise após Belenenses
O presidente do Sporting nega que alguma vez tenha tido uma
reunião para avaliar a continuidade ou a saída da equipa
técnica, embora admita que falou com a estrutura do futebol
após o jogo com o Belenenses. "Houve um resultado negativo
importante, porque tínhamos acabado de inverter uma má
série, tínhamos feito um conjunto de bons resultados,
até melhores do que as exibições. Não havia
razão para voltarmos aos maus resultados. Falámos porque
temos a preocupação de fazer um trabalho integrado, que
vise melhorar competências e rendimentos", assegura Bettencourt.
"Talvez veja em mim certeza de equilíbrio"
O ex-presidente Dias da Cunha, um dos principais opositores ao plano
de restruturação financeira apresentado originalmente por
Filipe Soares Franco, já veio apoiar a solução
protagonizada por Bettencourt. Este, recusando-se a justificar o
volte-face com o nome de quem apresenta o plano, encontra no passado
comum uma razão. "Talvez a minha vivência, a
noção da minha cultura sportinguista tenha tornado os
consensos mais fáceis. E eu e Dias da Cunha sempre nos demos
bem, acompanhei-o num período muito difícil do
Sporting... Há um respeito mútuo que o leva a olhar para
mim como tendo um certificado de bom-senso e de equilíbrio",
opina José Eduardo Bettencourt.
Em nome de um clima de "pacificação"
As palavras de José Eduardo Bettencourt não deixam
transparecer qualquer censura às críticas de Paulo Bento
à arbitragem. Pelo contrário, o presidente diz que o
treinador "já disse 40 vezes que está respaldado e
está-o de facto". Mas a última investida de Bento
não teve eco no gabinete da presidência. Porquê? "O
futebol português precisa de pacificação. Há
aqui um pouco de embirração com o Paulo Bento, mas cada
um tem a sua forma de lidar com isso. Eu tenho de acreditar em quem
exerce os cargos, ainda que ache que há coisas que deviam ser
mais bem explicadas." Que coisas? "Por exemplo, se a final da
Taça da Liga corre mal aos árbitros, alguém devia
explicar o que correu mal."
"Problema tem sido o rendimento colectivo"
O Sporting só contratou três jogadores esta
época, nenhum dos quais se impôs ainda de forma
categórica. Mas para Bettencourt o problema não
está nos novos: é o colectivo que os trava. "São
jogadores internacionais, que têm estado em bom plano nas
selecções. O Matías já se apurou para o
Mundial, é o craque da selecção do Chile. O
Caicedo é titularíssimo no Equador e entrou de forma
fantástica, fez treinos fabulosos, foi aplaudido de pé,
só que depois teve duas lesões. E o Angulo só foi
assobiado porque saiu em momentos em que os resultados eram negativos",
explica. "O problema não é dos reforços mas do
colectivo, cujos problemas lhes têm atrasado a
integração."
Passar receitas da TV para a SAD
A assembleia geral que hoje vai ter lugar no Pavilhão
Multiusos, no Estádio José Alvalade, terá apenas
dois pontos na sua ordem de trabalhos e é o segundo aquele com
potencial para gerar maior discussão, uma vez que reporta a uma
proposta da Direcção, relacionada com a
transferência da posição detida pelo clube na
Sporting Comércio e Serviços para a Sporting, SAD. Caso a
proposta seja aprovada - necessita de uma maioria qualificada de dois
terços dos votos e dos sócios presentes -, a SAD passa a
beneficiar directamente das receitas provenientes da
alienação dos direitos de transmissão televisiva
dos jogos do clube, medida fundamental para o projecto de
reestruturação financeira de Bettencourt. No primeiro
ponto serão discutidas as contas do clube.
In "O Jogo"
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