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Quinta, 25 Abril 2024
NEM O GOLO «OFF-SIDE» JUSTIFICA TANTA INSUFICIÊNCIA PDF Versão para impressão Enviar por E-mail
Domingo, 22 Setembro 1968 23:28

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U.Tomar – Sporting – 2-1

A cidade de Tomar teve ontem o seu primeiro dia grande de futebol com a visita do Sporting, um grande e um «leader» do Campeonato Nacional, um nome portanto mais do que consagrado e mais do que suficiente para justificar o extraordinário movimento da bela cidade nabantina e do entusiasmo e do ambiente que envolveram o Estádio Municipal, excelentemente situado no parque e todo ele de belas  e amplas perspectivas. E nem algumas reticências que entendemos fazer, noutro local, nesta primeira visita ao Estádio Municipal, em dia grande, as quais se destinam menos a crítica do que a eventual solução dos problemas, pode minimizar o excelente espectáculo oferecido ontem por toda uma cidade atrás do seu clube e toda uma multidão atrás do seu «leader».

 

 

O Sporting perdeu, vamos lá com a surpresa que sempre oferece a derrota de um grande frente a um clube de menos nomeada, para mais quando o clube de maiores recursos – e que excelente material humano dispõe o Sporting – ocupa, ainda por cima, o lugar de «leader» da classificação. E só não afirmamos que a derrota nada tinha de discutível ou de imerecida se não fora o primeiro golo dos tomarenses ter sido marcado em nítida posição de «off-side», assinalada pelo fiscal de linha, no momento do passe, que é quando a deslocação deve ser julgada, mas depois transformada por interpretação duvidosa do árbitro em lance legal. Mas o Sporting quase não tem o direito de «agarrar-se» a esse lance irregular, pois a seguir a 1-0, teve o União a «seus pés», e poderia ter resolvido o jogo, se «aperta» a velocidade. Cedeu o golo irregular, mas também algo consentido por uma defesa recheada de internacionais, que se desinteressou demasiadamente do lance antes de ouvir o apito do árbitro, para depois consentir um golo… defensável, outra vez pela sua grande defesa. Vamos ver como isso foi…

 

0-1 tão facilmente


O Sporting, de começo, adoptou um «4x3x3» flexível, recuando Marinho, que diga-se desde já, foi um jogador altamente influente no estilo de jogo da equipa e talvez o seu elemento mais regular, tornando-se o criador de lances no ataque e o jogador que mais auxiliou o meio do campo e acrescente-se também, já que vem a propósito, muito esquecido pelos colegas em lances da equipa, os quais se poderiam tornar envolventes e acabaram por afunilar o processo de ataque.

Mas aos cinco minutos, a deficiência no passe de Faustino e o desentendimento com o seu guarda-redes, deu ao Sporting vantagem no marcador. O vivíssimo Chico, muito oportuno a meter-se no meio da grande área – foi menos bom quando para lá passou – e muito hábil a desviar a bola de Arsénio, quando este atrasado se lhe lançou aos pés.

O União de Tomar acusou vivamente a desvantagem e, talvez mais do que isso, a maneira como ela se processou, tanto mais que Marinho, aos nove minutos, esteve em posição de marcar de novo, só que preferiu rematar, de pronto, quando tinha espaço à sua frente para preparar o remate final. Os lisboetas não souberam ou não puderam extrair vantagem desse golo, a posição ideal de uma deslocação difícil, e preferiram jogar sem pressas, sem ambições, com serenidade que a posição de um «leader» não admite. Por via disso, cedeu a iniciativa ao União, que a aceitou, para usufruir não só de superioridade territorial, mas também para jogar, por vezes, futebol de boa qualidade, com trocas e dribles bem executados e até com remates que forçaram Damas a sucessivas intervenções e a defesa a ceder alguns cantos. Mas a defesa do Sporting não parecia em situação de sofrer golos, pois os laterais e os centrais, em especial José Carlos, não davam oportunidades aos avançados contrários. Foi então que apareceu o golo de Leitão, já descrito, passado mesmo à frente da bancada de Imprensa, com Leitão deslocado no momento do passe, conforme foi assinalado pelo fiscal de linha. A defesa do Sporting pareceu confiante na indicação do fiscal de linha, Damas ficou na baliza e o próprio Leitão marcou um tempo de paragem até se decidir a marcar o golo. E quando se esperava a sua anulação, o árbitro validou-o. Mal, beneficiando um jogador em posição irregular, o que é contrário ao espírito da lei.

Temos para nós, no entanto, que José Carlos ou Armando poderiam ter dificultado Leitão e o próprio Damas talvez evitasse o golo se saisse prontamente da baliza, enquanto Leitão hesitava e esperava que a bola caisse no terreno para a dominar.

 

A «grande defesa» volta a comprometer


No segundo tempo, o Sporting procurou deliberadamente modificar o resultado e atacou muito, nem sempre bem, devido à falta de decisão na hora do remate e à ausência de jogadas envolventes, na esquerda, apesar da válida contribuição de Armando Luís na direita, não compensada na esquerda, já que Marinho era pura e simplesmente esquecido pelos companheiros. E como Chico, no centro, não foi o mesmo jogador da primeira parte a extremo, ficamos a recordar, como talvez tivesse sido útil a sua permuta com Marinho. Mas isto é campo da pura teoria que aqui se refere, para que alguma coisa de útil pudesse ter sido feito, no ataque do Sporting, tentando modificar um estado de coisas que não estava bem. Ganharam-se é certo alguns cantos, Lourenço teve um remate, mas mais nada…

O que é pouco.

E quando se pensava que o Sporting acabaria por marcar, mais tarde ou mais cedo, mais pela quantidade do que pela qualidade do seu futebol, sucedeu os tomarenses alcançarem o triunfo num golo em que a «grande defesa» do Sporting, que o é realmente, voltou a ser responsável. Aconteceu que José Carlos estava queixando-se, movendo-se com dificuldade e em determinado lance deixou-se ficar junto da sua baliza, escancarando todo o caminho que lhe competia vigiar na zona frontal da grande área. O passe de Leitão para Cláudio, primoroso de visão, colocou a bola à frente do brasileiro. Bom jogador, o negro das Américas, correu pelo «corredor de José Carlos», esperou a saída de Damas e fuzilou a baliza do Sporting. O capitão do Sporting, caído no terreno, visivelmente inferiorizado, só abandonaria o campo três minutos depois, substituído por Alexandre Baptista. Para o caso, já não interessa, mas importa referir que no onze lisboeta, na sua grande defesa, foram cometidas duas desatenções graves, responsáveis pela derrota:

1) A não substituição de José Carlos, cuja responsabilidade não sabemos a quem atribuir, nem isso nos interessa.

 

2) A falta de um elemento válido na cobertura da baliza, de dupla responsabilidade de José Carlos, como capitão de equipa e como elemento magoado.

A perder por 1-2, o Sporting foi para a frente. Muito para a frente, mas mal.

Sem calma, sem lucidez, sem decisão, vencido pelos adversários e pelos acontecimentos. Faltou, então, com trinta e cinco minutos por jogar – havia ainda tanto tempo – frenesi, determinação, uma «chicotada» da equipa para tentar, ao menos, salvar um ponto. A equipa não pareceu, psicologicamente, preparada e mentalizada, como «leader», para ganhar o desafio. E, adiante-se com tal estado de espírito, não se ganham campeonatos…

À meia-hora, o golo esteve iminente, na baliza de Damas, em nova e superior jogada de Leitão, que driblou Alexandre Baptista, que evitou a entrada da bola, sobre o risco de baliza.

 

Bom conjunto dos tomarenses


O União de Tomar alcançou um excelente triunfo, nas condições já descritas, num desafio em que foi, inegavelmente, a melhor equipa no terreno a que mais jogou e que mais dominou e a que mais rematou e não será o facto de ter marcado um golo irregular que minimiza a sua vitória.

A equipa fecha bem o caminho da baliza mete jogadores no meio do terreno e ataca com perigo, rematando, sempre que a oportunidade se lhe depara.

Arsénio jogou sem grandes problemas, chegando a sua atenção e a sua decisão para resolver os problemas da equipa. Mas no primeiro golo, talvez pudesse ser um tudo nada mais rápido para tentar emendar o companheiro.

Muito bem a defesa, com os laterais, Kiki e Barnabé, melhor o segundo, jogando sem comprometer, com maior ou menor dificuldade. Caló marcou muito bem Lourenço, no jogo alto como no rasteiro e Faustino fez outro tanto a Ernesto, primeiro e a Chico, depois, mas pesa-lhe a responsabilidade do primeiro golo e de muitas intervenções que lhe saíram defeituosas por deficiência de execução.

 

A meio do terreno Ferreira Pinto foi um capitão esclarecido e um jogador enérgico mas Cláudio tornou-se, na verdade, uma das vedetas da equipa, com a sua primorosa execução e o belo remate do golo da vitória, sem esquecer, Bilreiro, que jogou muito bem na primeira parte, recuando para o três do meio do terreno e revelando técnica aprimorada nas jogadas de ataque.

À frente, saliente-se Leitão, bem a jogar e a rematar, um problema para uma grande defesa como a do Sporting. Esteve nos dois golos e teve ainda outra jogada de golo, evitada por Alexandre Baptista. Alberto não pôde furtar-se à vigilância do José Carlos, cuja forma é magnífica e Totoi experimentou muitas dificuldades diante de Pedro Gomes. Vicente, animoso e batalhador, cumpriu o seu papel.

 

Uma equipa sem «chama»


O Sporting não soube aproveitar-se da vantagem de 1-0, alcançada logo aos seis minutos, cedendo o empate nas condições referidas, após o que não mais demonstrou capacidade para modificar um resultado que ainda lhe não era desfavorável, mas que acabou por sê-lo em lance em que também faltou um mínimo de visão dos acontecimentos para evitar o lance decisivo.

Damas, na baliza, no lance do primeiro golo, se tem sido suficientemente expedito, teria evitado o golo, mas acreditou no fiscal de linha…

Na defesa, Pedro Gomes foi o mais regular e o mais certo e o jogador que actuou mais «a sério» de princípio a fim. Armando alternou boas com más intervenções, terminando com visível dificuldade. José Carlos, que está em excelente forma, terá sido um dos responsáveis pela derrota, tanto no primeiro golo, em que não devia acreditar no fiscal, como no segundo em que ou deveria pedir a sua substituição ou abandonar o lugar entregando-o a um colega em boas condições físicas. Um internacional da sua categoria e um capitão da sua estirpe não tinha outros caminhos a seguir. Hilário com intervenções defeituosas a par de outras acertadas teve uma virtude: não comprometeu a equipa.

A meio do terreno, que nos pareceu, por vezes, muito abandonado, com os dois jogadores a adiantarem-se e a deixarem o terreno livre nos contra-ataques, Pedras exibiu-se discretamente, não acertando os passes e Gonçalves, se bem que mais acertado, não brilhou como lhe é habitual.

 

O ataque teve, no primeiro tempo, dois extremos, activos e empreendedores, em Chico e Marinho, mais desaproveitado o segundo que repetimos, foi o jogador com mais ritmo na primeira parte. Ernesto e Lourenço foram em todo o jogo, o segundo na primeira parte, o primeiro na segunda, elementos sem solução para os problemas que se lhe depararam.

Na segunda parte, Armando Luís deu ao futebol de ataque do Sporting, jogadas de habilidade, sem seguimento na grande área.

 

O árbitro


O árbitro portuense, João Gomes, a quem temos visto fazer boas arbitragens, teria confirmado a nossa impressão anterior se não fora o lance do primeiro golo do União de Tomar, o qual foi precedido de deslocação do autor do golo no momento em que a bola foi passada.

Em tudo o mais, bom trabalho do árbitro portuense.»

 

Estádio Municipal de Tomar

Árbitro – João Gomes, do Porto

U. TOMAR – Arsénio (2); Kiki (2), Caló (3), Faustino (1) e Barnabé (2); Ferreira Pinto (2) (cap.) e Cláudio (3); Leitão (3), Bilreiro (3) (45m – Vicente (1)), Alberto (1) e Totoi (1)

SPORTING – Damas (1); Pedro Gomes (2), Armando Manhiça (1), José Carlos (1) (58m – Alexandre Baptista (3)) e Hilário (1); Gonçalves (2) e Pedras (1); Chico (2), Ernesto (1) (45m – Armando Luís (2)), Lourenço (1) e Marinho (2)

0-1 – Chico – 6m
1-1 – Leitão – 34m
2-1 – Cláudio – 55m

 

«Aos 6 minutos: 0-1.

No flanco esquerdo do ataque sportinguista, um ataque dos lisboetas «morreu» nos pés de Faustino, que atrasou mal a bola para o guarda-redes, também hesitante a sair. Chico meteu-se de permeio e marcou.

Aos 34 minutos: 1-1.

Bilreiro serviu por alto, Leitão, que se encontrava «off-side», prontamente assinalado pelo fiscal de linha, mas ignorado pelo árbitro. Os jogadores do Sporting desinteressaram-se do lance, Damas incluído e o próprio marcador pareceu hesitante, mas pelo sim pelo não marcou. E foi golo…

Segundo tempo: 1-0.

Vicente substituiu Bilreiro, nos locais, enquanto no Sporting, saiu Ernesto para ceder o lugar a Armando Luís, que passou a jogar a extremo, enquanto Chico derivou para o meio do terreno.

Aos 10 minutos: 2-1.

Bom passe de Leitão para Cláudio, que à vontade, progrediu no terreno, pois José Carlos, magoado estava junto da sua baliza. Já dentro da grande área, arrancou um belo remate que bateu Damas.

Aos 13 minutos José Carlos abandonou o terreno magoado, sendo substituído por Alexandre Baptista, enquanto Hilário passava a capitão de equipa.

 

http://uniaotomar.wordpress.com - (“A Bola”, 23.09.1968 – Crónica de Aurélio Márcio)


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