O Sporting promete mudar de rumo - As eleições que vão enterrar de vez o projecto Roquette em Alvalade Versão para impressão
Sábado, 26 Março 2011 09:05

110326_eleicoesA atravessar a maior crise da sua história centenária, o Sporting escolhe hoje um novo presidente entre uma mão-cheia de alternativas. Cinco candidatos unânimes em cortar com o passado mais ou menos recente, apesar de diferentes gradações de ruptura.

O "roquetismo" é agora adjectivo pejorativo em Alvalade. Mas, numa campanha eleitoral flamejante, foram escassas as alternativas ao moribundo projecto com apelido do ex-presidente. É que, 15 anos depois da sua concretização, o que sobrou foi um gigantesco passivo, castrador de receitas para o futebol. Exactamente aquilo que pretendia evitar. Para já, o debate centrou-se em paliativos para o drama leonino. Por isso, seja quem for que vença esta noite, terá um futuro complicado no trono do "leão".

Foi com surpresa e algum choque que o universo sportinguista foi confrontado no final de 2005 com o fracasso de um sonho. Depois de uma década de concretização, o projecto Roquette falhara. Coube a Filipe Soares Franco ser o arauto da desgraça. Procurou transmitir a mensagem com suavidade, falando na necessidade de "renovação" do plano dos seus antecessores na presidência. Esta passaria pela venda de alguns anéis patrimoniais. Seis anos depois, já sobra pouco nos dedos leoninos e os credores mantêm um cerco apertado. E ainda ninguém sabe, com precisão, o que correu mal.

"Não escondo que, quando me anunciaram, em 2005, o fracasso do projecto Roquette, fiquei surpreendido. Eu e a maioria dos sportinguistas que, de um dia para o outro, foram alertados por Soares Franco para o facto de não haver outro remédio senão vender o património imobiliário não desportivo", recordou ao PÚBLICO Dias Ferreira, um dos cinco candidatos à presidência leonina, nas eleições de hoje. "Não digo que tenha sido sonegada informação, mas, pelo menos, ela foi apresentada aos sócios em tons cor-de-rosa. Nunca ouvi auditores ou o próprio conselho fiscal a apontarem para os perigos do rumo que estávamos a seguir. Ainda ninguém percebeu o que aconteceu e também ninguém o soube explicar", prosseguiu o advogado, que, como tantos outros, foi seduzido pela visão de José Roquette, em 1996, e do seu plano para um Sporting moderno, ambicioso e sustentado.

Em síntese, o projecto propunha adaptar o Sporting aos novos ventos futebolísticos que sopravam da Europa. O plano passava por dotar o clube de uma estrutura empresarial e profissional, ao mesmo tempo que apostava, através da rentabilização do património, na regularização da dívida ao fisco e Segurança Social, na construção de um estádio e uma academia. Tudo para tornar o clube sustentável, com soluções e independente dos resultados desportivos.

Década e meia depois, o panorama é deprimente. Um passivo bancário a rondar os 300 milhões de euros, um serviço de dívida que desvia importantes recursos do futebol, uma crise desportiva na modalidade motora do clube que afasta os sócios e adeptos e, com eles, directa ou indirectamente, receitas fundamentais. E da grande riqueza patrimonial de 1995 sobeja muito pouco.

O que aconteceu? "O projecto Roquette traduziu-se num falhanço total ao nível da gestão", conclui João Mineiro, economista e membro de uma lista independente candidata ao conselho fiscal. "Havia alguns princípios válidos, mas partia de pressupostos demasiado optimistas. Não foram ainda cumpridas algumas premissas que estavam subjacentes ao próprio projecto, nomeadamente na construção do novo estádio, que não previa um endividamento a 100 por cento. Não se compreende esta opção."

A "má gestão de recursos que foram colocados no clube" é também apontada por Godinho Lopes, candidato à presidência, para explicar o actual cenário. Mas o responsável pela construção do estádio e da academia, acusado pelas restantes candidaturas de representar a continuidade do que sobra do "roquetismo" (algo que rejeita veementemente), desvalorizou o peso do betão nas dívidas de hoje. "A dívida global das infra-estruturas do Sporting representa 80 milhões de euros no total do passivo. O resto é da responsabilidade dos prejuízos da SAD e da forma como não foram potencializadas as receitas dos activos, tanto ao nível dos jogadores como das infra-estruturas", defende.

Outro dos sonhadores de há 15 anos foi Pedro Baltazar, ex-administrador da SAD (como maior accionista em nome individual), que é agora candidato à cadeira presidencial. "Achei que era a solução, mas enganei-me redondamente. Numa base teórica, o projecto Roquette apresentava-se como um modelo vencedor, que prepararia o Sporting para os anos futuros, que já são estes. O que se passou foi que a escolha das pessoas, as formas de compadrio e a irresponsabilidade levaram a uma execução completamente diferente e sem rumo", analisou. "Houve anos de presidentes mais atentos e com algum êxito futebolístico, mas a sua média pecou exactamente por aquilo que referi: falta de liderança e de credibilidade", observa.

"Quiseram fazer do clube uma empresa e deixaram os sócios de parte", acusa Sérgio Abrantes Mendes, outro dos candidatos presidenciais, e dos primeiros a alertar para algumas consequências nefastas do projecto Roquette. "Falhou no projecto de tornar o Sporting sólido a nível financeiro, assim como de um projecto desportivo vencedor", resume Bruno de Carvalho, o candidato que mais surpreendeu nesta campanha, ao galvanizar muitos apoios com a promessa de corte radical com o passado.

Apesar de o Sporting estar a bater no fundo, não faltaram voluntários para assumir o leme, registando-se mesmo um recorde histórico de candidaturas. Para Frederico Abreu, líder da lista independente ao conselho fiscal do Movimento Ser Sporting, esta inflação tem outro significado: "Estas cinco candidaturas só revelam como o clube estava partido, mas por dentro."

 

In publico.pt


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